terça-feira, 16 de agosto de 2016

UMA DICOTOMIA ANTIGA: Direita e Esquerda.

“Direita e esquerda: palavras que fora da política se revestem de significados substancialmente simples: um lado ou outro do corpo, de uma estrada, de um rio. Ou, nos derivados – e a simplicidade já se reduz -, remetem para a habilidade [destreza] ou infortúnio [sinistro]; fortuna ou desventura; justo, recto (right) ou residual, posto de parte, deixado de lado (left).
«Nas línguas indo-europeias, nas conotações de sinister, gauche, linkish e maladroit e, por contraste, nas de right e rectitude, droit e droite, diritto e Recht, os termos que significam “direita” indicam habilidade, rectidão, o que é correcto do ponto de vista da moral, das leis e do costume e os termos para “esquerda” o oposto» [Lukes, 1997, 53]
Na linguagem política tudo se complica ulteriormente: as palavras da política vêm de longe, ainda que para muitos observadores (e para muitos políticos um pouco incultos) não se recue para lá de ontem.
Na realidade, as palavras «esquerda» / «direita» impuseram-se em toda a Europa e depois em todo o mundo, através da linguagem quer parlamentar, quer do socialismo, sobretudo a partir de 1870. Nas arenas parlamentares, os monárquicos e os bonapartistas (em França) sentavam-se à direita, os republicanos (e depois os socialistas) à esquerda [Laponce 1981], tomando o nome pela sua colocação nos espaço parlamentar.
[…] Apesar das declarações de obsolescência, no Ocidente – pense-se, para dar algum exemplo, na história dos últimos quinze anos em Itália, em Espanha, em alguns países do leste europeu e até nos Estados Unidos -, o espaço político continua a polarizar-se (ou a tornar-se mais rígido?) em torno da direita e da esquerda. Por vezes, as oposições são muito marcadas, baseando-se em conclamadas valências simbólicas, e se já não se alimentam das complexas construções ideológicas oitocentistas e não parecem baseadas na colocação dos sujeitos no espaço produtivo, não deixam de ser eficazes. Os símbolos ainda são poderosos factores de legitimação da ordem política, com a sua linguagem antiga e natural, emotiva e visceral, de fácil apreensão.
Em suma, direita e esquerda serão, pois, categorias da política moderna, mas de qualquer modo ainda continuam a ter sentido na política pós-moderna
É importante que nos interroguemos se isto acontece só para fins propagandísticos, para aumentar a visibilidade, atrair consensos, mobilizar, ou se os significados comunicados se traduzem em resultados concretos.”


Franco Cazzola, O que resta da esquerda. Mitos e realidades das esquerdas no governo. Lisboa, Cavalo de Ferro Editores, 2011, pp. 15-16 e 45-46.

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